Por Tania Jamardo Faillace
jornalista e escritora - RP1
ativista social
Com o salão comunitário da Igreja Mont’Serrat inteiramente lotado, relizou-se na noite do dia 25 do corrente mês uma reunião sobre a trincheira da rua Anita Garibaldi, por convocação das associações de moradores da área, que inclui vários bairros, bem na divisa entre as regiões 1 e 2 de Planejamento.
A trincheira da Anita é um dos projetos atribuídos à Copa de 2014, embora a FIFA seja totalmente inocente nessa questão. Consiste num alargamento da rua Anita Garibaldi, uma das ruas mais arborizadas de Porto Alegre, e que ainda conta com moradores antigos e prédios tradicionais, apesar da violenta especulação imobiliária que estão sofrendo os bairros Bela Vista, Boa Vista e Mont Serrat.
Essa trincheira, (valor de 11 milhões, que já foram acrescidos de mais alguns) segundo informado ainda ao final do ano pela Prefeitura, teria a finalidade de poupar UM semáforo na esquina da Anita Garibaldi com a III Perimetral (avenida Carlos Gomes), mediante um túnel-trincheira sob a avenida. Para isso, seriam feitas numerosas desapropriações que fatiariam os terrenos do lado norooeste da rua, mas poupariam os espigões modernos do outro lado, e derrubadas 60 árvores , além de transtornos à flora e fauna.da Praça Japão, e seu acesso pelos moradores.
A desculpa para isso, seria a lentidão e saturação da avenida Carlos Gomes em termos de trânsito, aumentando o tempo de seu trajeto.
Esse projeto, que não foi apresentado à CAUGE (conselho técnico municipal), nem ao Conselho Municipal do Plano Diretor (CMDUA) foi descoberto através de uma matéria jornalística. Indo atrás de esclarecimentos, as entidades locais descobriram que já estava em fase de licitação, sem qualquer licenciamento ambiental, ou processo legal constituído.
Participaram do encontro, duas técnicas da EPTC se revezaram para explicar os detalhes dos estudos, que foram baseados no Plano de Diretor de 1999, isto é, um PDDU defasado em 13 anos, e já revogado pelo Plano Diretor de 2009, que foi homologado em 2010.
Explicaram, voltaram a explicar, e não convenceram ao público que lotou o recinto. Principalmente porque eram desmentidas pelas fotos que projetaram, mostrando uma III Perimetral atravancada nas laterais por carros individuais, e completamente vazia no corredor de ônibus - apenas três linhas fazem o trajeto.
Como o metro quadrado da região está muito valorizado, é fácil deduzir que as desapropriações farão tombar os preços dos terrenos remanescentes, facilitando a vida dos empreendedores.
Na ocasião, foram mencionados outros túneis-trincheira e viadutos planejados, também concebidos de forma independente, sem vincular-se a uma visão estratégica da mobilidade urbana em Porto Alegre, e estudo aprofundado de origem e destino das viagens, apenas no número de carros particulares que trafegam naquela avenida e na Anita Garibaldi, e algumas outras ruas.
A nós, a justificativa nos parece pífia.
A questão do trânsito de Porto Alegre será resolvida em grande parte, quando for proibido o estacionamento em via pública. Hoje é coibido o embarque-desembarque principalmente dos passageiros de táxi (operação rápida), enquanto é permitido o estacionamento horário (ou de dia inteiro), não só nas áreas azuis, como em qualquer lugar, a qualquer hora, além de tolerado abusivamente o estacionamento em passeios sem qualquer repressão, multa ou guincho, uma vez que não há fiscais que façam isso.
Essa restrição ao estacionamento, liberaria pistas de fluxo nas ruas, e reduziria a circulação, porque a maioria dos condutores não desejam pagar vagas em garagens ou estacionamentos comerciais, e usariam a frota pública (coletivos e transporte seletivo), deixando seus veículos em casa, ou reservando-os para fins de semana ou atividades extra horários de pico.
No caso da Carlos Gomes, evidencia-se que essa III Perimetral está mal planejada e seu uso mal manejado. Com corredores de ônibus deslocados para junto das calçadas, em fila indiana, o que seu pequeno número admite sem problemas, todas as demais pistas seriam liberadas para o trânsito comum, podendo, inclusive, terem uso diferenciado segundo o destino. Isso exigiria apenas bom senso da Engenharia de Trânsito, e nenhum gasto financeiro ou de investimentos.
Este é o problema, aliás. Sem grandes investimentos (mesmo inúteis, ou principalmente, inúteis), como se arranjariam os lobistas e os intermediários?
A reunião foi bastante tensa, havendo momentos de rechaço óbvio da totalidade das pessoas (ressalvando os representantes institucionais), e conduzida pelo diretor da Secretaria de Governança, Plínio Zalesky (por cortesia do presidente da AMOBELA, promotora do encontro junto com a Associação de Moradores e amigos da praça Japão, e moradores da área, que lhe cedeu essa posição como anfitrião).
O Sr Plinio Zalesky mostrou uma truculência inaudita tanto ao dirigir-se ao grupo reunido, tentando conduzir e forçar seu comportamento e posições, como na forma grosseira como tentou impedir a fala do presidente da AMOBELA, inclusive com empurrão físico e arrebatamento de microfone, nada deixando a desejar aos tempos da ditadura militar.
As técnicas da EPTC também se comportaram sem qualquer disciplina e/ou moderação, repetindo vezes sem conta seus estudos e análises, interrompendo os debates, falando sem inscrição, e atropelando os trabalhos.
Estava evidente a rejeição unânime do projeto por parte da comunidade, e o poder público tentava evitar que isso se confirmasse numa resolução.
Também alguns secretários presentes deixaram a desejar em relação à serenidade que deveriam mostrar e dar exemplo.
Essa, aliás, vem sendo a tônica de boa parte das audiências públicas em Porto Alegre. O poder público manda, e a população deve acatar e fazer boa cara, e ainda agradecer por qualquer informação que recebam, como se a cidade fosse um feudo particular, e os moradores, inquilinos tolerados sem direito a voto.
Na dinâmica da reunião, falaram os representantes da Prefeitura (EPTC), depois foi lida por Luciana Zanini uma lista de 15 perguntas elaboradas pelo GT da Anita, que exigiam resposta institucional. Essa leitura foi tumultuada pelos representantes municipais, e não houve respostas convincentes, principalmente quanto a estudos estratégicos integrados, e análises de outras possibilidades técnicas. Também falaram o técnico em Engenharia de Trânsito, Eng. Paniz, que apontou as inconsistências da proposta; e o representante da Massa Crítica, esperançoso em relação às ciclovias, mas que não obteve grande apoio do público, uma vez que o tema em pauta era mais abrangente e interessava ao conjunto dos moradores de Porto Alegre.
Intervieram na hora dos debates a presidente da associação dos moradores e amigos da praça Japão, Ana Luisa Barbosa; Marta Araújo Santos, moradora da Anita; um comerciante não proprietário, empregador de 50 pessoas que serão demitidas, e ele não tem condições de indenizar, ao qual foi respondido que a prefeitura nada tem com isso, indeniza apenas o proprietário do imóvel, não o comércio deslocado; e alguns convidados, como Eduíno de Mattos, da RP7, que contestou a prioridade da trincheira, apontando o cruzamento da Aparício Borges como muito mais problemático para a classe trabalhadora, que anda de ônibus; o eng. Henrique Wittler, que apontou vários problemas na proposta da prefeitura, sugerindo alternativas mais fáceis, mais baratas e mais racionais para a solução daquele gargalo de trânsito; Tania Faillace, jornalista, que levantou a relação entre a especulação imobiliária e essa obra extemporânea, além de lembrar uma recente lei municipal que abre a possibilidade de substituir indenizações por bônus moradia, quando o motivo for a abertura ou alargamento de ruas, e a opção jurídica para garantir os direitos dos moradores; e Ibirá Lucas, suplente de conselheiro da RP1, que abordou a confluência de interesses dos dois Foruns que partilham a mesma área.
O final da reunião foi ainda mais exaltado, com manifestações gerais, exacerbadas pelo comportamento inadequado de Plínio Zalesky. Foi elaborado um manifesto pelo GT, e afirmado que as ações contra o projeto prosseguem, inclusive as judiciais, e que não se pode aceitar o início das obras no dia 28, independentemente da aceitação, rejeição ou propostas alternativas por parte da população.
Em resumo, a cada vez se confirma que a atual administração de Porto Alegre age de costas para a população, a fim de atender a interesses privados do setor especulativo fundiário/imobiliário.
Ah, como detalhe muito interessante, o titular da Secretaria de Obras e Viação afirmou que a obra está dispensada de EIA-RIMA, isto é, estudo de impacto ambiental e análise de compensações, porque faz parte do PDDU de 1999. No que foi contestado por alguns vereadores presentes (Sofia Cavedon, Fernanda Melchionna, Carlos Todeschini - Alceu Brasinha não se manifestou todo o tempo, nem Adeli Sell) lembrando que o PDDU estabelece DIRETRIZES e não projetos, e o de 1999 não tem mais vigência.
Registramos também a presença de Rosane Zottis, do gabinete do prefeito, a qual, porém, não se manifestou.
A terceira perimetral tem diversos problemas, e concordo com alguns apontados. Porém, quando se trata da Anita, é mais que necessária a retirada da sinaleira e a construção da trincheira. Quem passa por ali no horário de pico sabe como este cruzamento é pior que inclusive alguns com grandes avenidas. A verdade é que um bando de moradores egoístas não quer mexer onde afeta na sua rotina, na sua moradia, nas suas vidas. Esta obra me afetará, porque moro perto, mas pelo bem do trânsito algo tem que ser feito, e não somente as medidas simplistas sugeridas pelo moradores. Por isso nossa cidade não vai pra frente. Estou aberto à discussões.
ResponderExcluirconcordo
ExcluirMora perto, mas não na frente da tricheira, devia repensar tua opinião !! Quem sabe tu se muda para a esquina do cruzamento para ver o que é bom pra tosse!
ExcluirChegaste a participar da reunião? Moro bem na esquina da Anita com a Carlos Gomes, conheço bem o transito da região e concordo que deveriam ser tomadas providencias para melhora-lo. Fui na reunião imaginando que iriam nos apresentar todas justificativas para construção da trinchera e como o transito iria melhorar. Mas o que comprovei é que se trata de uma obra mal planejada, sem fundamento. Não apresentaram nenhum estudo ou modelo que justifique todo o gasto, transtorno e o impacto ambiental que ira causar. Diversas medidas poderiam ser tomadas para melhorar o transito sem a necessidade da construção da trinchera. Não tinha opinião formada, mas após a reunião sou contra a obra na Anita!
ExcluirConcordo que o projeto vai afetar toda a região, mas acredito que pequenos ajustes já irão fazer toda a diferença. Mas não fazer nada naquele trecho é ir totalmente na contramão do plano de mobilidade da cidade. Ou vocês gostam de ficar nos engarrafamentos diários daquele trecho?
ResponderExcluirDefendo também que deva ser feito mais duas coisas: uma ciclovia em toda a extensão da perimetral, e melhoria no transporte coletivo desta mesma perimetral. Até porque o T11 hoje em dia é uma piada, principalmente nos horários de pico....
Porto Alegre possui um Plano Diretor Cicloviário, e a Anita Garibaldi faz parte da Rede Estrutural deste Plano. Portanto, a Anita deve ter ciclovia, e esta deve ser BIDIRECIONAL, mesmo que haja só uma mão para os automóveis.
ResponderExcluirA passagem de nível proposta não possui infra-estrutura cicloviária, o que irá, talvez casuisticamente, comprometer a implantação da ciclovia no próximo governo.
A Cidade não vai pra frente justamente por obras desse tipo. É um planejamento limitado e imediatista, com prazo de validade vencido.
ResponderExcluirPor que a causa do problema não é discutida? O aumento indiscriminado do número de carros. A Via (que foi bem mal planejada) já está saturada, e não serão essas trincheiras - cujo termo me remete a uma guerra - que irão salvar a viabilidade do trãnsito dali.
O Hotel poderia ter um recuo para táxis. Mas não, ali na frente sempre tem carros estacionados que diminuem uma pista.
Espero muito que essa obra não aconteça.
Essa ideia de proibir o estacionamento nas vias públicas para liberar mais pistas segundo o texto:
ResponderExcluir"reduziria a circulação, porque a maioria dos condutores não desejam pagar vagas em garagens ou estacionamentos comerciais, e usariam a frota pública (coletivos e transporte seletivo), deixando seus veículos em casa"
Na minha opinião só traria benefícios ao ricos que podem pagar por estacionamentos, e com certeza quem sugeriu utilizar a frota pública tenho certeza que nunca utilizou um T11...
Sinceramente são moradores que só estão pensando em si e não na sociedade, porque a população tanto de pessoas como de carros só tende a crescer e temos que fazer o que for preciso para comportar todos.
Quando o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano aprovou o Zaffari da Furriel, com mais de 800 vagas de estacionamento, nenhum dos conselheiros havia sido informado pela Prefeitura da previsão de um trincheira da Anita a uma quadra do empreendimento, para o qual também não foram apresentados estudos do impacto na mobilidade urbana.
ResponderExcluirhttp://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/spm/usu_doc/ata_2412_de_01_de_junho.pdf
Não acredito que os estudos viários não tenham sido feitos. Seria amadorismo demais. E um estudo viário sério deve levar em conta o impacto dos empreendimentos que afetarão o fluxo das vias, como o Zaffari da Furriel e a ampliação do Iguatemi.
Então, se o estudo viário for apresentado, ficará exposta a contradição de uma obra que irá beneficiar diretamente pelo menos dois grandes empreendimentos, mas será custeada integralmente por todos os cidadãos, mesmo os que sequer tem automóvel.
Entreguei hoje a tarde um requerimento à Prefeitura Municipal solicitando que seja considerada uma área verde, nas proximidades da Carlos Gomes, como preservação para compensação pela retirada das árvores, conforme segue:
ResponderExcluirExcelentíssimo Senhor
José Fortunatti
Prefeito Municipal de Porto Alegre
N/Capital
Senhor Prefeito:
Com referência a intervenção na Rua Anita Garibaldi, para obras da passagem subterrânea e considerando:
• o que consta na RESOLUÇÃO CONAMA Nº 371, DE 5 DE ABRIL DE 2006 que Estabelece diretrizes aos órgãos ambientais para o cálculo, cobrança, aplicação, aprovação e controle de gastos de recursos advindos de compensação ambiental, conforme a Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza-SNUC e dá outras providências, no seu Art 10: “O empreendedor, observados os critérios estabelecidos no art. 9º desta Resolução, deverá apresentar no EIA/RIMA sugestões de unidades de conservação a serem beneficiadas ou criadas. § 1º É assegurado a qualquer interessado o direito de apresentar por escrito, durante o procedimento de licenciamento ambiental, sugestões justificadas de unidades de conservação a serem beneficiadas ou criadas;
• As inúmeras árvores que serão retiradas para construção da Passagem de nível da Rua Anita Garibaldi/Carlos Gomes e Cristóvão Colombo/ D. Pedro II, alterando todo o Bioma da região, a qual já vem sendo constantemente prejudicada pelos inúmeros empreendimentos imobiliários, apenas para citar um, mencionamos o conjunto de quatro grandes blocos, construídos pela Construtora Goldsztein, localizado em frente à Praça Província de Shiga, na confluência da rua Eng. Alfredo Correia Daudt e av. Plínio Brasil Milano. Nesse local foi feito um grande desmatamento de vegetação nativa;
• Na área em pauta, localiza-se importantes rotas migratórias dos mais diversos pássaros, e que tem seus ninhos nas muitas árvores da região;
• Que as medidas compensatórias que são apresentadas, só irão trazer benefícios daqui a muitos anos, pois serão plantadas mudas de árvores, que custam a crescer e costumeiramente são amontoadas nos canteiros das ruas;
Vimos apresentar como sugestão, a ser analisada pelo órgão ambiental licenciador de Porto Alegre, conforme legislação acima descrita, uma vez que a obra é imprescindível para que haja melhoria no trânsito, a reserva e transformação em Unidade de Conservação, ou Área de Proteção Ambiental (APA), o que melhor se adequar ao caso, uma área verde já existente na Rua Campos Sales, em continuação a Rua Guimarães Rosa, conforme mapa em anexo, onde existem muitas árvores, sendo a grande maioria nativas.
Assim, seriam beneficiados todos os moradores da região, não haveria alteração nas rotas dos pássaros e a cidade ganharia uma praça com árvores frondosas, talvez o último reduto significativo de vegetação, com predominância nativa, que existe nessa região da cidade.
Esta é a nossa sugestão contando, desde já, com o encaminhamento que seja julgado pertinente.
Porto Alegre, 27 de junho de 2012
Infelizmente essa obra na Anita com a Carlos Gomes é necessária. É normal que quem more nas imediações da obra sinta-se incomodado.
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